Excelente reflexão de Marcos Damigo, encontrada no blog Sobre Teatro, de sua autoria. Vale a viralização:
"Estamos vivendo uma explosão de atores fazendo monólogos. Bárbara Heliodora se diz revoltada com essa situação, que julga aviltante para o teatro. Sergio Britto, em entrevista - ainda inédita - que fiz com ele, confessa que, com exceção deste Beckett, faz monólogos por falta de opção.
Será que o monólogo está tão em alta apenas por uma dificuldade em produzir peças com mais atores em cena? Essa afirmação soa um pouco simplista. Temos agora mesmo em cartaz exemplos de ótimos trabalhos com apenas um ator em cena.
Longe de querer esgotar essa lista, mas só para dar um panorama do que estou dizendo, aí vão alguns monólogos que estão ou estiveram em cartaz ultimamente:
Celso Frateschi em Sonho de um Homem Ridículo, a partir do conto de Dostoievski. Ricardo Bittencourt em O Homem da Tarja Preta, de Contardo Calligaris. Sara Antunes, do Grupo XIX de Teatro, em Negrinha, que ela mesma adaptou de um conto do Monteiro Lobato. Beth Farias estreando Shirley Vallentine, dirigida por Guilherme Leme, que também está só em cena em O Estrangeiro. Alberto Guzik está no Satyros com o Monólogo da Velha Apresentadora. Marco Antônio Pâmio estreia em breve O Mediano, texto de Otavio Martins, que foi indicado ao prêmio Shell em São Paulo por sua atuação em A Noite Antes da Floresta, monólogo de Koltès. Por falar em Shell, Clarice Niskier ganhou o do Rio por Alma Imoral, Edwin Luisi também, por Eu Sou Minha Própria Mulher, e Marat Descartes ganhou o de São Paulo por Primeiro Amor, adaptado de uma novela de Beckett, autor que está sendo encenado em monólogo de Sergio Britto, na Última Gravação de Krapp e Ato Sem Palavras número 1, que foi feito recentemente por Antonio Petrin com direção de Francisco Medeiros, que dirigiu Otavio no Koltès. César Augusto, da Cia. dos Atores, dirigiu Álamo Facó em Talvez, e Marcelo Olinto, seu parceiro na mesma companhia, foi dirigido por Gerald Thomas em Bate Man, ambos no projeto Auto Peças, que a companhia fez ano passado. Roberta Estrela D’Alva, do Núcleo Bartolomeu de Depoimentos, escreveu e atuou, no estilo spoken words, Vai Te Catar. Elisa Lucinda, atriz e poeta, leva seus próprios textos à cena no iluminado Parem de Falar Mal da Rotina, que volta em cartaz mais uma vez. Na linha dos grandes sucessos de bilheteria, além da já citada Clarice Niskier, Paulo Gustavo foi indicado ao Shell no Rio por Minha Mãe é uma Peça, onde ele faz uma mulher, assim como Eduardo Martini em I Love Neide, que aproveitou o sucesso da personagem criada para a televisão. A também televisiva Luana Piovani fez Pássaro da Noite, e até Fernanda Montenegro se rendeu ao monólogo, e estreou Viver Sem Tempos Mortos, sobre a vida e a obra de Simone de Beauvoir. Isso sem contar asstand up comedies que pipocam no Rio e em São Paulo! E me desculpem se deixei de mencionar alguém.
Existe um certo preconceito contra os monólogos. Mas, sem querer generalizar, vejo uma tendência interessante nesse fenômeno, de atores com um projeto pessoal, que têm algo a dizer. Quando um ator encontra essa chama dentro de si, e se empenha na concretização deste sonho, é possível que o resultado seja uma recompensa tanto para ele quanto para o público. Pois tenho percebido que o que mais contribui para um teatro pouco expressivo é justamente a falta dessa conexão íntima e vital do ator com o que ele está fazendo.
Para citar alguns desses trabalhos que eu assisti e estão em cartaz: em Negrinha, Sara Antunes conduz o público com extrema delicadeza e riqueza de detalhes. A atriz passou meses sozinha na sala de ensaio, visitada às vezes pelo diretor Luiz Fernando Marques e o diretor de arte Renato Bolelli Rebouças. E o resultado desse mergulho se vê na composição surpreendente que a atriz, branca, faz de uma menina negra do século XIX.
Em O Estrangeiro, Guilherme Leme foi capturado pelo personagem quando o conheceu através do autor da adaptação do famoso romance de Camus, o dinamarquês Morten Kirkskov. Ele optou, junto com a diretora Vera Holtz, por uma encenação limpa e concisa, oposta à de Negrinha que é bem mais barroca, mas também muito interessante. Na peça, cria-se um jogo entre o que é visto em cena, limpo e minimalista, com a história que é contada, de um Marrocos cheio de sol e suor.
Minha Mãe é uma Peça foi escrita pelo próprio ator Paulo Gustavo, que interpreta uma mãe neurótica numa peça que começou sem tantas pretensões no pequeno Teatro Cândido Mendes, de lá ganhou grandes palcos e há anos não sai mais de cartaz. A peça é tratada como uma comédia, mas o riso talvez venha da atuação radicalmente contundente com que ele faz essa mulher só e frustrada.
Outro caso digno de nota é o de Clarice Niskier, que também já está com sua Alma Imoral há algum tempo pelo eixo Rio-São Paulo. Ela optou por mergulhar fundo num livro que a tocou profundamente. O curioso é que não há drama no livro, não há uma história, no espetáculo ela simplesmente compartilha, com domínio impressionante, as reflexões do autor Nilton Bonder com o público, que sai do teatro melhor e mais sábio.
Nessa mesma linha de um teatro revigorante e que não cansa de lotar teatros Brasil afora, Parem de Falar Mal da Rotina, de Elisa Lucinda, é outra pérola, onde ela propõe ressignificar o cotidiano, transformando atos banais em momentos de graça e prazer. É imperdível.
Em breve, Beth Faria e Marco Antonio Pâmio estreiam seus monólogos em São Paulo. Ela em Shirley Valentine, e ele em O Mediano. O que será que nos aguarda? Por estes poucos exemplos, talvez tenham razão os que acusam os monólogos de serem atos desesperados de atores sedentos por estarem no palco. Mas sinto também que talvez esse desespero prove ser mais um remédio que uma doença, para que o teatro seja cada vez mais vibrante e provocador.
E você, o que acha?"
"Estamos vivendo uma explosão de atores fazendo monólogos. Bárbara Heliodora se diz revoltada com essa situação, que julga aviltante para o teatro. Sergio Britto, em entrevista - ainda inédita - que fiz com ele, confessa que, com exceção deste Beckett, faz monólogos por falta de opção.
Será que o monólogo está tão em alta apenas por uma dificuldade em produzir peças com mais atores em cena? Essa afirmação soa um pouco simplista. Temos agora mesmo em cartaz exemplos de ótimos trabalhos com apenas um ator em cena.
Longe de querer esgotar essa lista, mas só para dar um panorama do que estou dizendo, aí vão alguns monólogos que estão ou estiveram em cartaz ultimamente:
Celso Frateschi em Sonho de um Homem Ridículo, a partir do conto de Dostoievski. Ricardo Bittencourt em O Homem da Tarja Preta, de Contardo Calligaris. Sara Antunes, do Grupo XIX de Teatro, em Negrinha, que ela mesma adaptou de um conto do Monteiro Lobato. Beth Farias estreando Shirley Vallentine, dirigida por Guilherme Leme, que também está só em cena em O Estrangeiro. Alberto Guzik está no Satyros com o Monólogo da Velha Apresentadora. Marco Antônio Pâmio estreia em breve O Mediano, texto de Otavio Martins, que foi indicado ao prêmio Shell em São Paulo por sua atuação em A Noite Antes da Floresta, monólogo de Koltès. Por falar em Shell, Clarice Niskier ganhou o do Rio por Alma Imoral, Edwin Luisi também, por Eu Sou Minha Própria Mulher, e Marat Descartes ganhou o de São Paulo por Primeiro Amor, adaptado de uma novela de Beckett, autor que está sendo encenado em monólogo de Sergio Britto, na Última Gravação de Krapp e Ato Sem Palavras número 1, que foi feito recentemente por Antonio Petrin com direção de Francisco Medeiros, que dirigiu Otavio no Koltès. César Augusto, da Cia. dos Atores, dirigiu Álamo Facó em Talvez, e Marcelo Olinto, seu parceiro na mesma companhia, foi dirigido por Gerald Thomas em Bate Man, ambos no projeto Auto Peças, que a companhia fez ano passado. Roberta Estrela D’Alva, do Núcleo Bartolomeu de Depoimentos, escreveu e atuou, no estilo spoken words, Vai Te Catar. Elisa Lucinda, atriz e poeta, leva seus próprios textos à cena no iluminado Parem de Falar Mal da Rotina, que volta em cartaz mais uma vez. Na linha dos grandes sucessos de bilheteria, além da já citada Clarice Niskier, Paulo Gustavo foi indicado ao Shell no Rio por Minha Mãe é uma Peça, onde ele faz uma mulher, assim como Eduardo Martini em I Love Neide, que aproveitou o sucesso da personagem criada para a televisão. A também televisiva Luana Piovani fez Pássaro da Noite, e até Fernanda Montenegro se rendeu ao monólogo, e estreou Viver Sem Tempos Mortos, sobre a vida e a obra de Simone de Beauvoir. Isso sem contar asstand up comedies que pipocam no Rio e em São Paulo! E me desculpem se deixei de mencionar alguém.
Existe um certo preconceito contra os monólogos. Mas, sem querer generalizar, vejo uma tendência interessante nesse fenômeno, de atores com um projeto pessoal, que têm algo a dizer. Quando um ator encontra essa chama dentro de si, e se empenha na concretização deste sonho, é possível que o resultado seja uma recompensa tanto para ele quanto para o público. Pois tenho percebido que o que mais contribui para um teatro pouco expressivo é justamente a falta dessa conexão íntima e vital do ator com o que ele está fazendo.
Para citar alguns desses trabalhos que eu assisti e estão em cartaz: em Negrinha, Sara Antunes conduz o público com extrema delicadeza e riqueza de detalhes. A atriz passou meses sozinha na sala de ensaio, visitada às vezes pelo diretor Luiz Fernando Marques e o diretor de arte Renato Bolelli Rebouças. E o resultado desse mergulho se vê na composição surpreendente que a atriz, branca, faz de uma menina negra do século XIX.
Em O Estrangeiro, Guilherme Leme foi capturado pelo personagem quando o conheceu através do autor da adaptação do famoso romance de Camus, o dinamarquês Morten Kirkskov. Ele optou, junto com a diretora Vera Holtz, por uma encenação limpa e concisa, oposta à de Negrinha que é bem mais barroca, mas também muito interessante. Na peça, cria-se um jogo entre o que é visto em cena, limpo e minimalista, com a história que é contada, de um Marrocos cheio de sol e suor.
Minha Mãe é uma Peça foi escrita pelo próprio ator Paulo Gustavo, que interpreta uma mãe neurótica numa peça que começou sem tantas pretensões no pequeno Teatro Cândido Mendes, de lá ganhou grandes palcos e há anos não sai mais de cartaz. A peça é tratada como uma comédia, mas o riso talvez venha da atuação radicalmente contundente com que ele faz essa mulher só e frustrada.
Outro caso digno de nota é o de Clarice Niskier, que também já está com sua Alma Imoral há algum tempo pelo eixo Rio-São Paulo. Ela optou por mergulhar fundo num livro que a tocou profundamente. O curioso é que não há drama no livro, não há uma história, no espetáculo ela simplesmente compartilha, com domínio impressionante, as reflexões do autor Nilton Bonder com o público, que sai do teatro melhor e mais sábio.
Nessa mesma linha de um teatro revigorante e que não cansa de lotar teatros Brasil afora, Parem de Falar Mal da Rotina, de Elisa Lucinda, é outra pérola, onde ela propõe ressignificar o cotidiano, transformando atos banais em momentos de graça e prazer. É imperdível.
Em breve, Beth Faria e Marco Antonio Pâmio estreiam seus monólogos em São Paulo. Ela em Shirley Valentine, e ele em O Mediano. O que será que nos aguarda? Por estes poucos exemplos, talvez tenham razão os que acusam os monólogos de serem atos desesperados de atores sedentos por estarem no palco. Mas sinto também que talvez esse desespero prove ser mais um remédio que uma doença, para que o teatro seja cada vez mais vibrante e provocador.
E você, o que acha?"
E você, o que acha?
Bacana, Max, boa sorte pra vocês!
ResponderExcluirQuem sabe eu consigo ver o espetáculo algum dia desses?
Abraço,
Marcos Damigo
Muito bom o artigo do Marcos!
ResponderExcluirObrigado por tão boa reflexão!